Não bato tambor. Não recebi o legado.
Como espantar a dor sem o sagrado ritmo?
Como chamar os espíritos
Para levantarem a força da terra,
das águas inundarem o amor,
arejar no ar a escuta de um voo?
Não tenho fogueira e o gênio do fogo
não me reconhece.
Não bato os tambores
Nem lanço no tempo a voz
Na cadência do chão e dos pés.
Meu legado são palavras
aprisionadas no sentido e na história.
Sem asas, sem chama, fogo-fátuo
no escuro a cintilar um fio de clamor.
Meu legado, longe das árvores portentosas,
é essa folha em branco, assassina do verde,
Manchada do azul da caneta bic e do resíduo de um olhar.
Meu legado é meu tempo,
que em mim inscreve minha história.
No refluxo da água, na poeira da terra,